terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Antes fosse a vida. Vivida.

Vinte e quatro anos. Se você pensar bem, chega a ser muito pouco. Eu, que fui abençoado com a memória de um peixe dourado, não tenho muitas lembranças dos meus primeiros dez anos de vida. Vá lá, tenho alguns lampejos de acontecimentos. A casa da infância, as pequenas estripulias. Mas não sou capaz de te relatar que aos 7 anos eu corri de um vespeiro todo, só pela burra idéia de excursionar o que na época me era floresta, mas que os adultos enfadonhamente chamavam de mato. Eu sei lá quando isso aconteceu, nem mesmo porque diabos eu e sei lá mais quem estava comigo resolvemos nos aventurar no matagal mais próximo. Mas pelo menos eu lembro das vespas, do álcool, da cara desaprovada da mãe.

Nisso, o que de uma pessoa normal já se pode tirar uns 4 ou 5 anos de tempo útil, eu perco um bocado. Subtraia o tanto que se dorme, se perde no trânsito, em discussões inúteis, arrumando o quarto, você chegará a uma inexorável constatação. De vinte e quatro anos você viveu bem uns dez, caso você tenha o incomodo hábito de se perder em discussões inúteis como eu. E se você ainda se atrever a pensar que foram dez verões, aí você vai sentir a facada. Dez? O pior é que ainda assim, se formos ser rígidos com a palavra, viver, viver de verdade, você não viveu. Na maior parte do tempo deixou as coisas seguirem a pasmaceira do sempre. Na simples comodidade de reclamar de longe, sentado de preferência. Foram poucos os momentos em que se realmente abriu os olhos. Acabamos sempre nos enrolando com pseudo-problemas, que atazanam as noites em que se devia apenas sorrir para tua turrona mania de se levar pelo desespero, mais sério que filme francês. Não acho que se deva deslizar pela vida, faixa na cabeça, cabelos emaranhados num psicodélico rock progressivo, só de paz, amor, e alpargatas. Os problemas, ainda que os menores, existem, por certo. Mas porque diabos viver a vida como se deles saíssem o prêmio. Como se o propósito de tudo fosse queimar cada pestana com esse ou aquele entrevero. Queria saber em que parte da minha infância, ou adolescência perdi a vista 20 por 20 que gostava de saber ter. Angustiado, de cabelos em pé, perdido pra lá e pra cá de uma só vez, fiquei míope. Vejo alguns centímetros do caminho, e me irrito com cada lombada.

Mas não acho que tenha esta felicidade sozinho. Vejo meus bons amigos, recém saídos da fôrma academicamente talhada, e completamente infelizes. Seja por não saberem ao certo o que realmente querem, seja por saberem e verem o tanto que terão de pelejar, não importa, o final é sempre o mesmo jogo marcado de querer o escuro, silêncio, talvez o útero materno. Queria chacoalhá-los todos. E me incluir no tranco. Inferno, se dormimos tanto, e o trânsito não dá sinal de melhora, vamos, pelo amor, deixar o inútil de lado e lembrar de sorrir dos chatos que somos, porque começo a perceber que o negócio não é só virar diplomata, procurador, grão-vizir, mas a pernada que foi. Eu provavelmente não vá lembrar de tudo, mas ao menos vou bater o martelo e dizer que fui feliz. Eu me contento com isso.