terça-feira, 26 de agosto de 2008

E só

Recebi um delicado e sutil, preste atenção. Eu aqui a debochar de mim, brincando com algumas verdades, e recebo o sempre benvindo comentário de que não existem más ações, mas ações, e só. Um singelo puxar de orelha para trazer quem escreve para a profundidade que o tema deve ter, obrigando esse que adora brincar, falar sério. Pois então, falemos.

Todo erro, do menor ao mais catastrófico, realmente nos leva a pensar. Seja para justificá-lo à nossa consciência, seja para tirar algo de construtivo daquilo. Justificativa é fácil, rápido e indolor de se ter. Cinco minutos de um mal-estar no espírito, duas viradas na cama e pronto, vêm o apaziguar da alma, mais rápido e tão fajuto quanto café solúvel, e se fica com a certeza de que a culpa foi da marca do leite que se tomou como criança, que faltava em vitamina B o que lhe falta hoje de vergonha na cara. É o tirar algo que valha que de fato tira o sono. E exatamente por se ter apreendido do ato um algo que sequer gostaria tivesse existido. E aqui reside a atenção buscada pelo enigmático comentário. Ficar a se prender nas adjetivações dos atos, certamente, não levará a coisa alguma. Penitência não resolve o muro. Nada surge daí que não comiseração. O mártir traz para si as almas mais afetas a esse jogo baixo mas patina no mesmo, só aumentando a resistência para os próximos tombos. Fica-se na dor, que por mais verdadeira que seja, nunca foi suficiente para se crescer. O velho ditado pasteuriza um bom bocado do processo, subvertendo a lógica e pondo cor naquilo que não passa de um efeito colateral. Não é da dor que se cresce e sim de como se encara o ato pelo qual tanto dói. A isso, por mais descolado que possa ser, não vale de nada ficar se murmurando que é um pecador, um errante, um malfeitor, com cara de choro e Byron a tira colo. Aceitar o ato, como só ato que é, é ter de encará-lo não apenas como algo concreto, mas como externação consciente e querida de quem agiu, logo, você. E isso é bem mais dolorido do que buscar cafuné pela dó. O crescimento acaba por vir no perceber das limitações que te fizeram ter escolhido agir de tal ou qual maneira. É de fato identificar o porquê para que na próxima encruzilhada o ato que venha a ser tido seja o melhor que você acredita poder ser. Colocar em prática o livro Nietzsche for dummies e ser homem bastante para, eternidade adentro, quantas vezes te porem a escolha na frente, você tomar a mesma. Se tiver de deixar a bufonice de lado, diria que esse tipo de certeza não vem choramingando pelo bobo, parvo, ou menino que se é, mas no enfrentar aquilo que não é mais nada do que ato teu, e só.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Procedimento


No primeiro ato de humildade tido na vida, vem o infeliz questionar o porquê e querer o como. Já que é a primeira vez que tenho o distinto desprazer de perder algumas palavras com este que agora suplica pela resposta que acreditava ter na ponta da língua, em milhões de sinônimos, pincelo o que se consegue. Fez 25. Loiro. Branco. Estatura nem pouca nem muita. Fala. Muito. Vaidoso. Gasta significativa parte da vida tentando estar alinhado, mas de linha isso daqui não tem nem ponto. Teimoso. É bobo em horas inapropriadas, apropriadas. É bobo. Tem de suas inteligências, mas quem as não têm. Anda de um jeito esquisito, escreve de um jeito esquisito, toma café, lê o jornal, comenta do tempo, enfim, pensa que é vivo.
Feito com o máximo de esmero o resumo que se dá para ter, vou ao que tenho de ir. Porque és um parvo. Um míope de si mesmo que só vê no outro platéia, numa encenaçãozinha barata e sem graça de um arremedo de novela mexicana. Agora não me venha com mumunhas a me dizer que quer outra pessoa que não si mesmo ao lado porque quando lado havia, teus olhos se ocupavam com tudo que não fosse a penitente que cumpria a sina.
É sem hora de começar a viver de suas meias palavras, largar esse vazio de insignificante existência, então te aconselho a se valer de um incrível desenvolvimento humano que parece te ser novidade. Terapia. Mas não se preocupe não, a quem se contentou por tantos anos com o pouco que é você, qualquer meia luz que vier será resplandecente, isso no miraculoso dia em que revirar os olhos de dentro para o resto que acontece por aqui. Agora, te aviso, confesso que com gosto, aquela luz que te inundava tomou rumo, meu rapaz. Ponha na conta da tua parvoíce.
É meu porquê, são meus conselhos. Toque-se o procedimento.

 
Diogo Barbazu Labrego
Conselheiro da Secretaria das Idiossincrasias e Filigranas Únicas do Desenvolvimento Humano – SIFUDEHU

 

 
Não posso deixar de me envergonhar com a rispidez de meu colega conselheiro. Tudo bem que o pobre que agora chora às tampas não é exemplo de retidão, mas não creio que o cenário para tamanha escuro. Tem sim de suas inteligências, de sua bondade, de sua doçura. Sensibilidade e carinho acompanham de tempo seus traços. De certo nem sempre pensava nas consequências das palavras, por vezes se perdia em seu próprio turbilhão, e nisto não se encontrava para encontrar o outro, mas nunca por mal. Não há, de fato, maldade. Há um confuso querer beber do mundo e de metódico e encucado que é, ainda não arranjou como verter a cuia sem cair gota, e assim vai sem conseguir sentir o gosto de nada, seco da vontade. Terapia de fato lhe faria bem, a aparar algumas dessas arestas que acabam raspando o carinho que lhe é inerente, o cuidado pelo outro que pauta a vida, as próprias ambições. Um lapidar desta pedra que tem seu brilho. Concordo com o conselho, divirjo no porquê.

Michaela Augusta dos Anjos
Conselheira da Secretaria da Esperança na Racionalidade Adulta – SERA

 

 
Tendo a opinião de ambos mesmo rumo, a despeito do dissonar da causa, que se expeça ofício determinando terapia ao ora suplicante. Notifique-se para o quê de direito. Anote-se nos livros atinentes. Arquive-se decorrido o prazo.

 
Miguel Jorge
Ministro do Desenvolvimento

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Another lonely day


Peguei me lembrando, diante da brabura destes tempos negros, de como eu me comportava em domingos.Tinha 15 anos e era um daqueles bobos que você, menina, ignorava. Tinha arroubos intensos e arrebatadores de uma melancolia sem fim, o que já me deixava ainda mais esquisito do que só a brancura, o aparelho e o fato de ser bobo, porque convenhamos, bobos nessa idade todos somos, mas que moleque de 15 anos sofre, e ainda mais por melancolia... Cumpria o roteiro ultra-romântico a risca, ensaiando os primeiros capítulos da minha vida novela mexicana e passava a tarde pensando nela, fosse quem fosse ela, olhando para a chuva como se fosse a materialização do meu espírito, ouvindo uma música a mais triste que dava pra ser sem ser Legião Urbana, numa sala que até hoje me dá saudades. Dor, muita dor, toda a dor do mundo por aquela que, se sabia que eu existia, ressentia o fato. Não pertencia, obviamente, ao grupinho "garotos-sensação" e os achava todos saídos de uma mistura macabra de Malhação e filme sessão da tarde do mais representativo gênero quarterback/cheerleader/nerd, cabendo a mim, mas claro, o último posto, a contragosto. Passei meu ginásio e quase todo meu colegial ruminando este sentimento ruim de ser sozinho e de fato me chateava porque nenhuma das meninas da época queriam mais nada que só pose de mal. Aonde fica a conversa? Cadê o gostar do outro, o saber do outro? Dez anos depois já não faço o tipo nerd, pelo menos não escancaradamente, mas de novo me vi sentando em uma sala, num domingo que chovia. O problema agora é outro, ainda que a conseqüência seja quase a mesma. Hoje não sofro mais da ignorância da outra parte, mas faço o papel obtuso do que aparentemente não dá a menor para ela, como se personificasse aquele garoto-sensação de antes, só que sem a desculpa de se ter 15 anos. Tive o relacionamento entre os dedos e o vi escorregando lento, inerte demais para perceber a apatia dos dedos, a burrice da ausência, o isolamento em si mesmo. Perdi o que por tanto chorei enquanto crescia e consigo ver a minha antiga cara de desaprovação, amaldiçoando tamanha insensibilidade. Agora o que sobra é fechar para balanço, contabilizando os erros com a ajuda de um corpo de contadores que trabalham 24 horas a fio, com o doído de cada uma das farpas merecidas, tentando saber em que parte me perdi daquele menino adolescente e de seu querer de cuidar, se é que ele algum dia de fato existiu ou já era semente do dramalhão que estava por vir e não passava mais do que monólogo. Bom mesmo seria se tivéssemos uma secretaria para esse tipo de coisa. Alguma coisa encaixada no Ministério do Desenvolvimento, a receber nossas súplicas, apontando em papel passado, timbre oficial, o porquê e como.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Vou me profissionalizar em bafo

Tive a felicidade de ganhar uma noite para não fazer nada nessa quinta feira. Passei 4 horas esparramado na frente da televisão, sem nenhum remorso intelecto cultural, num mar insípido de fútil entretenimento. Fui logo de America's Next Top Model, para entrar de solo na estupidez vazia, e quase tive overdose. Pra que perder tanta água potável com essa gente que só serve para fazer o resto do mundo se achar feio, entrar no cheque especial e te fazer ficar uma hora ansioso para saber se é a loirinha ou a ruiva que sai no último bloco (malditas mulheres bonitas, todas elas!).
Depois desse entupimento de nada nas artérias, acabei me desviando do curso e me peguei prestando atenção em algo que valia a pena, perdi 15 minutos da minha ociosidade assistindo a Grande Família. Mas logo me recuperei em grande estilo quando deixei as olimpíadas tomarem conta do tubo. De longe nada tem a ver com a babaquice de pseudo modeletes que acham que o que não está publicado na Vogue não está no mundo, mas convenhamos que não se exige qualquer esforço intelectivo assistir um bando de marmanjo, (que toda vez que lembro terem 5 anos a menos que eu, me irrito profundamente e me pego perguntado o que é que eu fiz que não estou competindo pelo ouro olímpico), se desembestando a nadar. Vi o sem graça do Phelps ganhar sei lá qual das trocentas medalhas de ouro que o que não sabe perder ganhou.

Depois da crônica do ganhador anunciado encerrei minha ociosidade com chave de ouro, numa emocionante partida de ping pong. E não me venha você em dizer que o correto é tênis de mesa, porque isso não passa de uma tentativa mal remendada de dar verniz de seriedade para o esporte mais ridículo do mundo. Será que sou só eu que quando vejo a mesa, a redinha, mini raquetes e uma micro bolinha de plástico, penso diretamente em infância, e sala de jogos de hotel barato? Primeiro que é uma sacanagem sem fim o fato de fingirem ter competição. Competição de quem? Todos os jogos que eu vi era um japonês contra outro japonês, e a única coisa que mudava era a bandeirinha no canto do vídeo. Estamos numa olimpíada, bilhões de chineses assistindo, junto com o que restou de população e são dois japoneses, frente a frente, intercalados por uma mesícula azul, o foco de toda a atenção. O melhor é todo o mise en scène da coisa, o cuidado no segurar a bolinha na palma da mão como se origami de papel crepon fosse, as quicadas ritmadas e concentradas antes do saque, o olhar fixo nela, pro alto, mãos de shiva e pimba, vai a bolinha, volta a bolinha, vai a bolinha, fica a bolinha. E assim eles vão até que um japonês ganha a partida e todo mundo finge que não se morre de rir por dentro lembrando de quando se tinha 10 anos e ping pong era a única saída para a chuva na casa da praia. Acho que o Brasil poderia inovar nas de 2014 e propor uma nova modalidade de jogo, o triatlon infanto-juvenil, composto de bafo, bolinha de gude e empinação de pipa a distância. Ia botar o ping pong no chinelo.

ps: é só pausa num tema mais dolorido, que já vem, mas que é custoso de sair.