Recebi um delicado e sutil, preste atenção. Eu aqui a debochar de mim, brincando com algumas verdades, e recebo o sempre benvindo comentário de que não existem más ações, mas ações, e só. Um singelo puxar de orelha para trazer quem escreve para a profundidade que o tema deve ter, obrigando esse que adora brincar, falar sério. Pois então, falemos.
Todo erro, do menor ao mais catastrófico, realmente nos leva a pensar. Seja para justificá-lo à nossa consciência, seja para tirar algo de construtivo daquilo. Justificativa é fácil, rápido e indolor de se ter. Cinco minutos de um mal-estar no espírito, duas viradas na cama e pronto, vêm o apaziguar da alma, mais rápido e tão fajuto quanto café solúvel, e se fica com a certeza de que a culpa foi da marca do leite que se tomou como criança, que faltava em vitamina B o que lhe falta hoje de vergonha na cara. É o tirar algo que valha que de fato tira o sono. E exatamente por se ter apreendido do ato um algo que sequer gostaria tivesse existido. E aqui reside a atenção buscada pelo enigmático comentário. Ficar a se prender nas adjetivações dos atos, certamente, não levará a coisa alguma. Penitência não resolve o muro. Nada surge daí que não comiseração. O mártir traz para si as almas mais afetas a esse jogo baixo mas patina no mesmo, só aumentando a resistência para os próximos tombos. Fica-se na dor, que por mais verdadeira que seja, nunca foi suficiente para se crescer. O velho ditado pasteuriza um bom bocado do processo, subvertendo a lógica e pondo cor naquilo que não passa de um efeito colateral. Não é da dor que se cresce e sim de como se encara o ato pelo qual tanto dói. A isso, por mais descolado que possa ser, não vale de nada ficar se murmurando que é um pecador, um errante, um malfeitor, com cara de choro e Byron a tira colo. Aceitar o ato, como só ato que é, é ter de encará-lo não apenas como algo concreto, mas como externação consciente e querida de quem agiu, logo, você. E isso é bem mais dolorido do que buscar cafuné pela dó. O crescimento acaba por vir no perceber das limitações que te fizeram ter escolhido agir de tal ou qual maneira. É de fato identificar o porquê para que na próxima encruzilhada o ato que venha a ser tido seja o melhor que você acredita poder ser. Colocar em prática o livro Nietzsche for dummies e ser homem bastante para, eternidade adentro, quantas vezes te porem a escolha na frente, você tomar a mesma. Se tiver de deixar a bufonice de lado, diria que esse tipo de certeza não vem choramingando pelo bobo, parvo, ou menino que se é, mas no enfrentar aquilo que não é mais nada do que ato teu, e só.
2 comentários:
Ah, sim! Seria muito fácil reconhecer os atos apenas como fatos decorrentes daquilo que se optou. A concretude do ato, como resultado da experiência própria, dá sempre algum sossego, afinal é algo que está feito, irremediavelmente.
Aí, a responsabilidade que se tem é apenas a de viver com o fato, consumado.
Aprender? Talvez, mas certamente imbuído de algum referencial valorativo.
Ah, os valores. Desses, meu caro, não se escapa sem confundir água e bebê, ao limpar a pia bastismal. Isso, pois o bebê e o significado da água usada no rito de iniciação, se integram numa só poça de atos e culpas.
Aprender? Para quê? Ah, claro! Para sentir menos culpa das próximas vezes. Não sei não, talvez seja preferível viver o risco de ser o bebê que urina na água... E o contrário me parece também tanto real.
Aprender? Sim. Mesmo que paire monstruosa dúvida sobre tua, minha, nossa capacidade de fazê-lo. Mesmo que tudo e todos pensem o contrário. Mesmo que nunca tenhamos visto exemplo algum. Verdade. Não adianta procurar, a consciência e a ética não estão nos livros, mas abandoná-las significa arcar com custo alto demais para se pagar. Mais do que nunca, acreditar é preciso.
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